sexta-feira, 1 de outubro de 2010

O catavento


A esperança incontida
De passar os dias
Escrevendo sentenças
Vitais.
Tudo o que aprendi
No ato, no auge
Do sofrimento
A não escrita palpita
A dor.
Preciso dizer
O que nunca foi dito.
A crença da mulher,
O príncipe encantado,
Os sonhos impossíveis
Aflitos.
Confusões hereditárias.
Muitas lágrimas
Pelo caminho.
A vida retalhada,
Cada dobra,
Uma sina.
Aprendi o amor
Depois da cisão,
Quase uma sutura
Cicatrizada.
Quase perfeita.
O ato de refazer.
Este é o segredo da vida.
Aprendemos, mulheres da
Minha época, a costurar.
Pois nem todo o remendo
É mau sinal.
Aprendi a remendar
Com perfeição.
Costurei de ponta a ponta.
Refiz o amor.
Refiz minha união carnal.
Agora vou bordar com
Pérolas, pedrarias, linha
Cintilante amarela.
Agora vou dormir
Com ele.
Vou casar de novo.
Cresci.
Fui machucada.
Apedrejada.
Refiz.
Renasci.
Não tive juízo.
Fui sem limites
Na crença de ser mulher.
A dor doeu rasgando.
Fui despedaçada.
Refiz.
Renasci.
Montei, reformei o
Catavento destroçado.
Coloquei no ponto mais
Alto, para girar...
Está girando
A cada dia mais
Veloz.
Refiz.
Finalmente
Aprendi a remendar.


Sílvia Goulart


Um comentário:

  1. Porque poesia é algo tão profundo e tão simples? Em cada detalhe, vários mundos.

    O sopro do catavento depende do estado de seu material. Remendados são sempre melhores que amassados ou desgastados. Ele gira e dá o tom da vida.

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