sábado, 9 de outubro de 2010

A fonte de Cora Coralina



A arte goiana ama ser imaginada onde não existe. O amor sonoro da ema representa este lugar sagrado para o artista. A mulher ancestral que Cora Coralina canta em seus poemas amorosamente cuida do povo goiano devido ao caráter ancestral de sua cultura. O ouro goiano que o Brasil não explorou com a coragem bandeirante será descoberto sob a forma de música.

Ouvir é função do poeta. Com o mar como metáfora, Fernando Pessoa criou a musa generosa, mas exigente, que, ao final de longa viagem pelos abismos da alma, receberia os “beijos merecidos da verdade”. Pessoa corresponde à “cabocla velha de mau-olhado” que Cora Coralina dizia viver dentro dela.




O mito brasileiro de que somos um povo alegre e pacífico somente será compreendido se compreendermos que o mito cumpre o papel da arte inovadora, que perscruta o anseio do momento histórico por qual passa a coletividade. O povo amadurece em ciclos, que correspondem a períodos de intensa provação. Com o mito, o alimento ornamental é tecido pelo povo enquanto cordura característica apta a sonhar. Com o sonho, o longínquo se aproxima e encanta.

O jeito goiano de reverenciar o boi espelha-se na goianidade obscura que Cora Coralina visitava em sonhos. O boi ritualizado em Goiás perde o medo de encantar-se pela princesa. O homem noivo já existe. A arte o torna astro cobiçado. O jeito mundano desse moço é mariologicamente guarnecido. Apesar do mundo lhe pintar os pés de amarelo, ele cobre-se de branco. Há nesse homem pássaro a sombra de um medo. Seu coração de Cristo eleva-o. O guerreiro humano acende-se em pontos caboclos. No canto do sertão mítico, as águas voam.



O rock erige dionísios fortes. Mas o santo os abate, como galos no terreiro. Os americanos do norte criaram um músico regional – o negro inventor do jazz e do blues. O negro ativa um Homero incendiário, no sentido de alegre músico angelicalmente sonhado como estrela. O rito ardente de moças brancas que amam dionísios músicos de rock iguala-se em Goiás ao fenômeno da música sertaneja. O astro explode em milhões de seguidores. O nome do mito de ontem ativa o antigo rei lusíada. O manto de Dionísio amplia o seu rei jurado.


Marcus Minuzzi


Um comentário:

  1. Um dia permito-me querer ser adotado por esta mãe; Depois de querer ainda terei que merecer.
    Por hora, sou conscientemente ignorante: um galo roqueiro no terreiro do matadouro.

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