terça-feira, 22 de março de 2011

O perdão para Anibel


A voz quase rouca alucina
O mantra da exclamação contida
Em teu povo anterior.
Quase rocha,
Quase encarnação bendita de tua luz.
A inteira pátria em teu gesto materno.
As idas e findas andanças...
Mescla em teu diário de pobrezas,
Sonhos e fracassos espirituais.
A ânsia por estar em novo território.
A busca da perfeição do ser.
Senhor, me conceda o perdão.
Porque pequei contra tudo
O que bordava o meu caminho inigualável,
Duro, gelado como vento minuano:
Não pousei na relva abençoada que me destes.
Abortei meus dias claros.
Manchei minhas esperanças.
Há em mim um forte impulso, senhor.
Quero ser um átomo cósmico.
Quero ser um arcanjo com vestes brancas.
Quero amar o príncipe da pureza.
Rastejo-me aos teus pés.
Lava-me os cabelos
E perdoa-me as fraquezas da alma feminina.
Impurezas carnais, leitos enxovalhados,
Mortes veladas.
Imploro pelo caminho aberto
Impregnado pelo perfume
Das magnólias na manhãzinha.
Juro, senhor.
Prosseguirei no compasso,
Na cadência,
No ritmo amoroso dos teus tambores.
De lá, ouvirás minha voz.
Verás que bela sou a te cantar
As palavras molhadas em riachos.
Há, meu senhor, dentro do meu ser,
Uma serpente de sabedoria.
Há também uma amazônica
E fértil extensão de florestas.
Há um jequitibá em flor.
Cipó,
Citronela cheirosa de outubro,
Ocimum basilicum.
Plantei o pedaço mais verde em minha alma.
Há também uma coroa de espinhos,
Que me acompanha desde o primeiro dia,
Que me sangra,
Mas que conservo por conta
Das minhas penitências terrestres.
Aceita antes de amanhecer
O meu verso singelo,
A minha doação pela escrita,
O meu encanto de dama,
A porção de beijo e bico materno.
Aceita meu pedaço de carne,
Minhas chagas.
Em nome de tudo que é sacro.
Em nome de tudo que é perdão.



Requinte de sinhá

Bebi o vinho.
Pude ser,
Sentir o efeito da riqueza
Em minhas mãos.
Traços finos,
Requinte de sinhá.
Está em mim esta rainha.
Me visita hoje.
Suas vestes inspiram
Uma grandeza que assombra.
Está em mim.
O poder me assusta.
A nobreza me cabe hoje.
Só espero que o dia amanheça
E traga meu reinado.




Poemas e pinturas:
Sílvia Goulart
Fotos: Marcus Minuzzi

2 comentários:

  1. Te amo, meu amor, pela perfeição dos versos e a sabedoria amazônica. Te amo demais, pela serpente que nos engole.

    Marcus.

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  2. Você é meu pássaro,
    E se desfaz como água,
    Como imaginação.

    Em essência,
    Acho que é isso:
    Os pássaros são inalcançáveis.

    Há um mistério me atravessando que diz:
    Tenho um compromisso com os pássaros.

    Basta eu fechar os olhos que voo,
    Sou tomado por visões de passarinhos.

    Qualquer passarinho pousado num fio de luz
    Me leva daqui.

    Então, se existem mulheres várias,
    Você é a mulher pássaro.

    E por isso que és minha.

    Especialmente por isso,
    E menos por outras razões.

    Há uma luz no teu rosto que denuncia isso,
    Uma circularidade,
    Quase uma bênção, para mim ainda não enxergável.

    Nunca foi tão claro para mim
    O teu espírito de pássaro,
    Embora ainda
    Precise decifrá-lo mais completamente.

    Como, por exemplo, saber
    Porque o meu desejo de simplicidade,
    De água pura,
    De bico e barro,
    Coisas simples e essenciais da natureza,
    Te fazem passarinho.

    Acho que é
    Porque estou casado com uma deusa,
    Ou é porque me foi prometido
    Este casamento mãe-de-terra,
    Como se voltássemos ao que somos.

    Te amo. Marcus

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